Natal, 25 de fevereiro de 1984, uma semana antes do Carnaval. Como de costume, a tranquila cidade do Natal organizava com entusiasmo seus bloquinhos de carnaval, que, há alguns anos, desfilavam com gente empolgada antes mesmo do período carnavalesco.
Através de um acordo com empresas de ônibus, a Prefeitura de Natal disponibilizara transportes exclusivamente para os foliões e para as bandinhas que se apresentavam nos blocos e eventos no período. O produtor cultural Dickson Medeiros também tratou de colocar seu bloco na rua, o “Cordão dos Puxa-Saco”, que sairia naquele dia reunindo cerca de 5 mil foliões. Era um “mar” de gente, entre amigos e familiares, pelas ruas da capital, a terceira edição do bloco, e também sua consolidação como um dos blocos de maior sucesso na cidade.

Mas em um destes transportes infelizmente estava o motorista Aluízio Farias Batista, um jovem de 26 anos que trabalhava na Viações Guanabara, que havia recebido de seu chefe a notícia de que deveria trabalhar naquela noite além do expediente para cumprir o acordo com a Prefeitura, e isso o deixou bastante irritado. Ele, mesmo aceitando para manter seu emprego, não sabia que faria a sua última viagem como funcionário da empresa Guanabara.
Na madrugada daquele dia Aluízio tinha a missão de deixar em seu ônibus metade dos integrantes da escola de samba “Malandros do Samba”, que haviam acabado de se apresentar no bairro do Alecrim, e estavam voltando para sua sede, localizada no bairro das Rocas. Era um percurso de pouco mais de 4 km, uns 15 minutos de carro. Os integrantes da escola estavam extremamente animados dentro do ônibus, cantavam alto, tocavam e batucavam, bem ao contrário do inconformado motorista.

Enquanto isso na rua, o “Cordão dos Puxa-Saco” caminhava animado reunindo jovens e adultos ao som de sucessos tocados da bandinha. O bloco iria se dispersar na Praia do Meio, e a previsão era que a folia naquela madrugada seguisse até o amanhecer do dia.
Dentro do coletivo os ânimos estavam exaltados, integrantes da escola animados versus motorista estressado, e, segundo relatos, ocorreu uma discussão. Os integrantes da escola de samba falando alto e apressados para chegar em casa, começaram a puxar a corda de campanhia do ônibus, e isso deixou Aluízio ainda mais nervoso. Aluízio acelerou o carro e saiu em alta velocidade pelas ruas de Natal, sem respeitar os semáforos, sem cautela nas curvas, e prestes à perder o controle. Ouviu várias reclamações dos passageiros e pra eles teria respondido: “Se tiver que morrer, morre todo mundo”.
Na rua, há poucos quarteirões dali, o bloco de Dickson fazia uma pequena parada na Praça Carlos Gomes para que os integrantes procurassem o banheiro, comprassem bebidas e lanches, mas infelizmente eles deparariam com o ônibus de Aluízio em disparada antes que pudessem retomar sua caminhada.
Próximo de 1h da manhã, nas proximidades do então recém-inaugurado Viaduto do Baldo onde estavam os foliões, surgiu o ônibus. Ao fazer uma curva da Avenida Rio Branco, sua traseira bateu em um carro modelo Fusca, que estava estacionado no canteiro, desviando para a rota fatal: o “O Cordão dos Puxa-Saco”. Naquele momento o veículo já estava sem controle, Aluízio viu o ônibus em que dirigia invadir o lado da pista onde os quase 5 mil foliões se divertiam, atingindo-os como bonecos, e jogando-os por vários metros.

O ônibus passou em alta velocidade pelo meio do bloco, vitimando pessoas por num trecho de mais de 80 metros ate a subida da avenida. “Como presidente do bloco, eu tinha que ficar observando o funcionamento de tudo, principalmente da banda. Eu estava do lado dos músicos até o momento em que o bloco passou pela igreja de São Pedro. A partir daí passei a dançar com uma mulher na frente do bloco e, quando estava no meio da subida eu me virei, aí vi a cena mais horrível da minha vida. Como foram muitas pessoas atingidas, a rua se transformou num verdadeiro mar de sangue”, disse Dickson Medeiros.
Quando chegou ao alto da Rio Branco, Aluízio abandonou o ônibus acreditando ser o final da tragédia, mas o carro desceu sozinho a ladeira, atingindo até quem já ajudava os feridos. Há relatos de que era possível ouvir o estralar de ossos das vítimas. Foi quando um rapaz chamado Adailson Pereira de Oliveira teve uma atitude heroica, ele conseguiu subir no coletivo e puxar o freio de mão, parando o carro quase imediatamente.
O carnaval ficou mudo, só se ouvia choros e gritos. Um laudo do ITEP na época afirmou que não houve nenhuma falha mecânica no ônibus. O acidente deixou 19 mortos e 11 feridos gravemente. O trauma nas pessoas provocado por isso varreu durante muitos anos o carnaval de rua em Natal. Muitas pessoas escaparam justamente porque o bloco estava disperso pela pausa na praça, e não em posição de aglomeração.
Alguns dias depois da tragédia, Aluízio Farias Batista se apresentou à polícia, prestou depoimento e foi misteriosamente liberado. Depois disso ele nunca mais foi visto.
Em 15 de maio de 2009 ele foi condenado a 21 anos de prisão em regime fechado, mas a prisão nunca aconteceu.
Em 2005 o programa Linha Direta da Rede Globo de Televisão fez uma matéria que ilustra bem o triste ocorrido, assista aqui:
Mortos no acidente: Wellington Teófanes de Assis, Walace Martins Gomes, Francisco Alves da Silva, Dinarte de Medeiros Mariz Neto, Abimael Florêncio Bernardo, Jaecy Cabral de Oliveira, Murilo Alberto Viana da Silva, Luiz Inácio da Silva, Esdras César da Silva, José dos Santos Xavier, Acelúsio Borges Gomes, Jethe Nunes de Oliveira, Benedito Alves da Silva, José Luiz da Silva, Simone Banhos Teixeira, Milton Servita de Brito, José Félix de Lima, Astor dos Santos Dantas e Rizomar Correia dos Santos. Dezenas de pessoas ficaram feridas.
Deixo aqui minhas sinceras condolências aos familiares das vítimas 🙁
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6 Comentários
Giovannia Elaine Saraiva
(17 de fevereiro de 2019 - 22:18)Não sei de quem foi a ideia, mas algumas dessas vítimas dão nomes a ruas do Bairro Nossa Senhora da Apresentação – na parte do loteamento Aliança: Abimael Florêncio Bernardo, José Luís da Silva e Rizomar Correia dos Santos.
Henrique Araujo
(18 de fevereiro de 2019 - 10:48)Bem observado. Obrigado
Paulo Oliveira Jr
(30 de março de 2019 - 16:49)Me lembro bem do acidente. No outro dia passamos pela Rio Branco e os bombeiros estavam lavando a avenida. Era muito sangue e miolos espalhados no chão.
Pulava carnaval na turma do tirol, que naquele ano homenageava a olimpíada de LA.
Flávio
(27 de janeiro de 2021 - 06:54)Agora o motorista foi finalmente encontrado.
Henrique Araujo
(27 de janeiro de 2021 - 08:07)Não era ele não amigo
Henrique Araujo
(27 de janeiro de 2021 - 13:35)Nao era ele não