Nós do Curiozzzo sabemos da importância de alguns acontecimentos históricos memoráveis, e da necessidade de que eles não caiam no esquecimento, por exemplo, este fato impressionante aqui.
Você já ouviu falar em Paulo Reglus Neves Freire, ou apenas Paulo Freire? Ele foi um educador pernambucano, que apesar de ter sido de classe média, vivenciou a pobreza e a fome na infância, experiência que o levaria a se preocupar com os mais pobres, e mais tarde o ajudaria a construir um revolucionário método de alfabetização.
O ano era 1962. Seu projeto educacional estava bastante alinhado à filosofia política do então presidente da república da época, João Goulart, que promovia o nacionalismo desenvolvimentista. Foi então que naquele mesmo ano, aos 41 anos, depois de aplicar seu método de alfabetização em Pernambuco, ele foi convidado para testá-lo na humilde e trabalhadora cidade de Angicos (a 194 km de Natal), porém com um objetivo pra lá de ousado: alfabetizar centenas de trabalhadores de forma rápida e barata, a maioria pertencente à extração da cana-de-açúcar e da construção civil.
Freire criticava o sistema tradicional de alfabetização, o qual utilizava a cartilha como ferramenta central da didática para o ensino da leitura e da escrita. Seu método consistia basicamente de 3 passos: o primeiro era catalogar as palavras mais conhecidas e usadas diariamente pelos trabalhadores como: “tijolo”, “enxada”, “corte”, “coragem”, “chuva”, “promessa”, “medo”, “branco”, “preto”, “Deus”, etc.

Depois, Freire fazia o chamado “momento da tomada de consciência do mundo”, em que ele junto com seus alunos analisava os reais significados sociais das palavras coletadas, comparando-as com suas realidades. Para ele, o diálogo aberto era o mais importante do processo educativo, e não a aula discursiva. E depois vinha a etapa em que o professor desafia e inspira o aluno a para uma postura conscientizada do mundo.

A maratona de aulas começou e contou com 380 matrículas, chamando atenção de toda a cidade. O evento ficou conhecido como “As 40 horas de Angicos” ou “A Experiência de Angicos”. Em 2 de Abril a façanha completou sua quadragésima hora de aula, que contou com a presença do presidente João Goulart, o governador do RN Aluízio Alves, entre outras autoridades. Neste mesmo dia formaram-se 300 alunos restantes.

Entre as autoridades presentes na solenidade de formatura de Angicos estava o general Castelo Branco, que um ano após aquela aula de conclusão de curso assumiu a presidência da República com o golpe militar de 1964. Ele não fez pronunciamento público no encontro, mas disse a Calazans Fernandes, secretário estadual de educação na época, que o projeto estava “engordando cascavéis”. Um ano depois, um dos atos de Castelo Branco após sua posse foi o de desarticular o grupo do educador Paulo Freire, mandá-lo prendê-lo e exilá-lo. A experiência lá de Angicos, que seria levada para outras cidades do Brasil como “projeto-piloto” do Programa Nacional de Alfabetização em 1964, infelizmente não se espalhou.

Um mês depois, fazendeiros e donos de terra organizaram uma greve na cidade de Angicos, e chamaram o projeto de Freire de “praga comunista”. Com medo, muitos educandos e educadores queimaram e enterraram seus cadernos, e a experiência foi encerrada. Algumas pessoas que participaram dela também foram presas durante a Ditadura Militar. Antes de partir para o exílio no Chile, Paulo Freire foi preso e passou 70 dias na cadeia. Na prisão, um dos oficiais responsáveis pelo quartel solicitou a ele que alfabetizasse alguns recrutas e ele explicou que estava preso justamente por alfabetizar.
Paulo Freire foi considerado nos Estados Unidos como o terceiro maior intelectual do mundo, de toda a história da humanidade, e o mais citado, portanto mais estudado, nas universidade norte-americanas. Ele ganhou 29 títulos de Doutor Honoris Causa em universidades Americanas e Européias. Hoje ele é considerado um dos pensadores mais notáveis na história da pedagogia mundial, tendo influenciado o movimento chamado pedagogia crítica.
O evento é considerado o processo de alfabetização mais efetivo da história da aprendizagem humana. Paulo Freire morreu em São Paulo em 2 de maio de 1997.
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